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Dia Nacional do Chimarrão: História, Benefícios e Tradições da Erva-Mate

O dia está amanhecendo aqui em São Bonifácio, e como de costume, a primeira coisa que faço é preparar meu chimarrão. Esse ritual diário se tornou parte fundamental da minha vida desde que conheci essa bebida tradicional durante minha viagem pela América do Sul há anos atrás. Hoje, dia 24 de abril, celebramos o Dia Nacional do Chimarrão, e não poderia deixar de compartilhar um pouco sobre essa paixão que trouxe da Argentina e que ganhou ainda mais significado quando conheci minha esposa Daiane, natural do Rio Grande do Sul.





Índice



Qual é o Dia do Chimarrão?


O Dia Nacional do Chimarrão é comemorado anualmente em 24 de abril. A data foi oficialmente estabelecida para celebrar essa bebida típica que representa muito mais que um simples hábito - é um símbolo cultural do sul do Brasil, especialmente do Rio Grande do Sul, além de países como Argentina, Paraguai e Uruguai.

A data foi instituída pela Lei n° 11.117 de 18 de maio de 2005, reconhecendo a importância cultural e histórica dessa tradição secular. Lembro-me como se fosse ontem da primeira vez que experimentei chimarrão em uma pequena cidade argentina. Na época, achei o gosto um tanto amargo e peculiar, mas hoje não consigo imaginar minha rotina sem ele!


A História do Chimarrão: Das Origens Indígenas ao Símbolo Cultural


O chimarrão tem suas origens nos povos indígenas Guarani, que já consumiam a erva-mate muito antes da chegada dos europeus, aproximadamente no século XV. Eles chamavam a bebida de "caá-i", que significa "água de erva" na língua guarani. Os indígenas consideravam a planta sagrada, um presente de Tupã, e atribuíam a ela propriedades medicinais e energéticas.

Quando comecei a me interessar pela bebida, mergulhei em pesquisas para entender sua história e fiquei fascinado ao descobrir que os jesuítas foram grandes responsáveis pela sistematização do cultivo e disseminação do consumo da erva-mate durante as missões no século XVII. Eles aperfeiçoaram técnicas de cultivo e processamento, o que permitiu a expansão do consumo.

A tradição do mate foi sendo incorporada pelos colonizadores e, eventualmente, transformou-se no chimarrão como conhecemos hoje. No nosso Kurpark em São Bonifácio, inclusive plantei algumas mudas de Ilex paraguariensis (nome científico da erva-mate) como forma de homenagear essa história e conectar nossas raízes alemãs com a cultura sul-americana. Ainda estou ansioso para ver se vão se adaptar bem ao nosso terreno!


Arvore de Erva Mate com placa "Erva Mate"
Uma Erva Mate em Urubici - Espero que o meu cresça bem também

O Que é o Chimarrão? Ingredientes e Como é Produzido


O chimarrão é preparado basicamente com dois ingredientes: erva-mate moída (Ilex paraguariensis) e água quente. Entretanto, por trás dessa simplicidade existe um processo complexo de produção da erva-mate que envolve várias etapas:


  1. Colheita: Tradicionalmente feita entre maio e setembro, quando os princípios ativos da planta estão mais concentrados.

  2. Sapeco: Primeira etapa após a colheita, onde os ramos são expostos rapidamente ao calor do fogo para inativar enzimas e evitar a oxidação.

  3. Secagem: Processo onde a erva perde umidade em secadores.

  4. Cancheamento: Trituração grosseira dos ramos e folhas já secos.

  5. Estacionamento: Período de descanso da erva que pode durar de 6 meses a 2 anos, dependendo do tipo de erva desejado.

  6. Moagem e classificação: Etapa final onde a erva é moída e separada de acordo com o tamanho das partículas.


A qualidade da erva-mate é fundamental para um bom chimarrão. Existem diferentes tipos de moagem e composições que influenciam diretamente no sabor e na duração da cuia. Alguns preferem erva-mate mais grossa que "dura mais na cuia", outros preferem moagens mais finas que proporcionam um sabor mais intenso.


O Ritual de Preparação do Chimarrão


A preparação do chimarrão é quase um ritual e varia de região para região. O método tradicional gaúcho que aprendi com minha esposa Daiane segue estes passos:


  1. Encha 2/3 da cuia com erva-mate.

  2. Incline a cuia para que a erva fique apoiada em apenas um lado.

  3. Adicione um pouco de água fria no espaço vazio (isso ajuda a preservar os nutrientes e evita que a bomba entupa).

  4. Insira a bomba (canudo metálico) no mesmo lugar onde colocou a água fria.

  5. Complete com água quente (entre 60°C e 65°C para um consumo mais seguro).

  6. Continue adicionando água à medida que vai bebendo.


Minha esposa Daiane sempre ri quando me vê preparando o chimarrão com tanto cuidado. Segundo ela, adquiri um ritual próprio que mistura a técnica gaúcha tradicional com algumas "inovações alemãs" - como ela brinca. A verdade é que preparar chimarrão virou quase uma meditação para mim, especialmente nas manhãs quando trabalho no projeto do Kurpark.





A Importância da Temperatura da Água: Uma Questão de Saúde


Sei que não vou fazer muitos amigos entre os gaúchos tradicionais com o que vou dizer agora, mas a ciência não deixa dúvidas: a temperatura do chimarrão é uma questão importante de saúde. Os gaúchos tradicionalmente adoram seu chimarrão "pelando" - quanto mais quente, melhor. Porém, estudos recentes apontam para riscos significativos nessa prática.

Segundo pesquisas da Organização Mundial da Saúde (OMS), publicadas na revista científica The Lancet Oncology, o consumo frequente de bebidas em temperatura acima de 65°C pode aumentar consideravelmente o risco de câncer de esôfago. Esta pesquisa analisou dados de cerca de 1.000 publicações sobre o tema e identificou que o calor excessivo pode causar lesões repetidas na mucosa do esôfago e da boca.


Pense no seguinte: se você colocar seu dedo em água acima de 65°C, sentirá dor imediata. Agora imagine o que essa temperatura faz com a delicada mucosa da sua garganta e esôfago diariamente. As evidências são preocupantes: o Rio Grande do Sul registra cerca de 20 casos de câncer de esôfago para cada 100.000 homens, uma incidência 10 vezes maior que a região Norte do Brasil.

Foi por essa razão que decidimos investir em um aquecedor de água com regulador de temperatura. Agora conseguimos preparar nosso chimarrão sempre na temperatura ideal - entre 60°C e 65°C - garantindo não apenas o prazer da bebida, mas também preservando nossa saúde. Esta pequena mudança no hábito diário permite que continuemos desfrutando da nossa paixão pelo chimarrão de forma mais segura.


Para quem não tem um aquecedor com regulador, uma dica é utilizar um termômetro específico para líquidos (vendido em lojas especializadas) ou simplesmente deixar a água descansar por cerca de 5 minutos após a fervura antes de usá-la no chimarrão.


Minha Coleção de Cuias: Uma Paixão (às vezes problemática!)


6 diferentes Cuias para tomar chimarrao
Minha Coleção de Cuias. Já levei varias para a Alemanha e deixei com familiares e amigos

Para o desespero da Daiane, ao longo dos anos desenvolvi uma verdadeira paixão por colecionar cuias. Cada uma tem sua função específica: tenho uma pequena para viagens, uma média para o dia a dia, uma grande para quando recebemos amigos... E sempre encontro uma "justificativa" para adquirir mais uma!

As cuias tradicionais são feitas de porongo (uma espécie de cabaça), mas também existem opções em madeira, cerâmica, vidro e até mesmo chifre de boi. Cada material confere características diferentes à experiência de tomar chimarrão:


  • Porongo/Cabaça: A mais tradicional, que "cura" com o tempo e dizem que melhora o sabor.

  • Madeira: Proporciona um sabor mais suave e mantém a temperatura por mais tempo.

  • Cerâmica: Mais fácil de limpar e não altera o sabor da erva.

  • Vidro: Ideal para iniciantes pois permite visualizar a colocação correta da bomba.


Recentemente, após comprar minha décima cuia em uma feira de artesanato, Daiane decretou um limite para minha coleção. Bom, oficialmente não posso comprar mais nenhuma (isso é uma piada entre nós), mas sempre dou um jeito de argumentar sobre alguma "característica especial" da próxima cuia que encontrar.


12 Benefícios do Chimarrão para a Saúde Comprovados Cientificamente


Como responsável por um Kurpark - um parque de cura na tradição alemã - tenho especial interesse pelos benefícios à saúde do chimarrão. A ciência moderna tem confirmado muitas das propriedades medicinais que os indígenas já atribuíam à erva-mate, desde que consumida na temperatura correta:


  1. Poderoso antioxidante: A erva-mate contém polifenóis, saponinas e xantinas que combatem os radicais livres no organismo, em quantidade superior inclusive ao chá verde.

  2. Estimulante natural: A presença de mateína (similar à cafeína) proporciona energia sem causar irritabilidade ou insônia como frequentemente ocorre com o café.

  3. Auxílio digestivo: Estimula a produção de bile e sucos gástricos, facilitando a digestão e aliviando desconfortos intestinais. Notei isso pessoalmente nas minhas viagens pelo Brasil.

  4. Efeito diurético: Ajuda a eliminar toxinas e reduzir a retenção de líquidos no organismo.

  5. Fonte de vitaminas e minerais: Contém vitaminas do complexo B, A, C, E, além de minerais como cálcio, ferro, potássio, magnésio e manganês.

  6. Controle de peso: Estudos da Universidade Federal de Santa Catarina demonstraram que o chimarrão pode auxiliar no controle do apetite e acelerar o metabolismo.

  7. Redução do colesterol: Pesquisas indicam que o consumo regular pode reduzir os níveis de colesterol LDL (o "ruim") no sangue.

  8. Proteção cardiovascular: Os componentes da erva-mate podem ajudar a reduzir a pressão arterial e melhorar a circulação sanguínea.

  9. Propriedades anti-inflamatórias: Reduz processos inflamatórios no organismo graças aos seus compostos fenólicos.

  10. Melhora na capacidade cognitiva: Pessoalmente, notei uma significativa melhora na minha concentração ao trabalhar no projeto do Kurpark enquanto tomo chimarrão.

  11. Saúde bucal: Alguns estudos sugerem que compostos da erva-mate podem inibir bactérias causadoras de cáries e mau hálito.

  12. Fortalecimento do sistema imunológico: Os nutrientes presentes na erva-mate podem fortalecer a imunidade natural do corpo.


É importante ressaltar que, como qualquer bebida com propriedades estimulantes, o chimarrão deve ser consumido com moderação. Nutricionistas recomendam não ultrapassar 10 cuias diárias. Além disso, pessoas com certas condições médicas devem consultar um médico antes de consumir chimarrão regularmente.


Como é o Gosto do Chimarrão? Uma Experiência Sensorial


Muitas pessoas me perguntam sobre o sabor do chimarrão, especialmente os visitantes alemães que conhecem nosso projeto do Kurpark. O chimarrão tem um sabor inicialmente amargo e herbáceo, com notas terrosas e vegetais. A experiência sensorial vai além do gosto:


  • Sabor: Amargo característico, que varia conforme o tipo e idade da erva.

  • Aroma: Herbal, refrescante e levemente adocicado.

  • Sensação: Refrescante apesar de ser servido quente.

  • Efeito: Estimulante e revigorante.


Para quem experimenta pela primeira vez, o amargor pode ser surpreendente. Existem alguns truques para iniciantes:


  • Começar com ervas de moagem mais fina e sabor mais suave.

  • Adicionar casca de laranja desidratada ou outras ervas aromáticas.

  • Não deixar a água muito quente, pois intensifica o amargor.

  • Algumas pessoas iniciam com adição de açúcar ou mel, embora os tradicionalistas considerem isso uma heresia!


Hoje, percebo nuances no sabor dependendo da erva utilizada. Existem ervas mais suaves, outras mais intensas, algumas com notas levemente adocicadas. Em nossas viagens pelo sul do Brasil, sempre aproveitamos para experimentar ervas-mate de diferentes regiões.


Os 10 Mandamentos Sagrados da Roda de Chimarrão: Tradição e Etiqueta


Uma das características mais fascinantes do chimarrão é seu aspecto social e as regras não escritas que o cercam. Para os gaúchos, essas regras são quase sagradas e fazem parte da experiência. Conhecê-las é fundamental para quem quer participar de uma autêntica roda de chimarrão sem cometer gafes:


  1. Não peças açúcar no mate - O chimarrão é amargo por natureza! Você até pode adicionar outras ervas na água, mas JAMAIS açúcar. Se você não suporta o amargor, melhor nem participar da roda.

  2. Não digas que o chimarrão é anti-higiênico - Sim, a cuia passa de boca em boca por todos da roda, mas jamais questione esta prática. Para os gaúchos, isso é parte da comunhão social.

  3. Não reclames que o mate está quente demais - Na tradição gaúcha, "mate bom é aquele pelando". Se todos estão tomando sem reclamar, você também deve aguentar (embora, como mencionei anteriormente, por questões de saúde, você pode optar por temperaturas mais baixas em casa).

  4. Nunca deixes o mate pela metade - Você deve tomar toda a água servida até escutar o "ronco" característico do fim do mate.

  5. Não te envergonhes do "ronco" no fim do mate - Este som é normal e indica que você tomou o chimarrão corretamente, esvaziando toda a água.

  6. NUNCA mexas na bomba - Este é provavelmente o mandamento mais importante. Mesmo que a bomba esteja entupida, jamais mexa nela. Se isso acontecer, devolva o chimarrão para quem o ofereceu e deixe que resolva.

  7. Respeite a ordem em que o mate é servido - A cuia deve circular sempre na mesma ordem, geralmente em sentido horário. Não se impaciente se estiver demorando sua vez.

  8. Não "durmas" com a cuia na mão - Quando estiver em uma roda de chimarrão, não use a cuia como "microfone" enquanto fala. Converse à vontade, mas tome seu mate rapidamente. Caso demore, provavelmente escutará a famosa frase: "Conheço um vivente que morreu com a cuia na mão".

  9. Não critiques o cevador por tomar o primeiro mate - O primeiro mate costuma ser o mais forte e até mesmo desagradável. Quem o toma está prestando um favor aos demais.

  10. Jamais fales mal do chimarrão - Se aceitou participar da roda, tome e aprecie. Como dizem os gaúchos: "uma vida vivida com o chimarrão valeu a pena".


Na roda de chimarrão, a pessoa que prepara (o cevador) toma a primeira cuia para testar o sabor, e depois a cuia passa entre os participantes seguindo estas regras. Este ritual cria momentos especiais de pausa e conexão. Enquanto a cuia circula, histórias são compartilhadas, problemas discutidos e amizades fortalecidas.


Uma observação importante sobre a etiqueta: Durante a roda de chimarrão, não se agradece a cada cuia recebida. Apenas quando você não deseja mais participar da roda, deve dizer 'Obrigado/a' ao devolver a cuia. Este gesto sinaliza ao anfitrião ou à pessoa que está servindo o chimarrão que você não quer mais continuar na roda. Não agradecer durante a roda não é sinal de falta de educação, mas parte da tradição!


Eu com bombacha e chimarrao
O Gaúcho Alemão

Dicas para Quem Quer Começar a Tomar Chimarrão


Se você ficou curioso e quer experimentar o chimarrão, aqui vão algumas dicas práticas:


  1. Escolha uma boa erva: Prefira ervas tradicionais, com selo de qualidade e data de fabricação recente.

  2. Invista em uma cuia adequada para iniciantes: As de vidro ou cerâmica são mais fáceis para os primeiros contatos.

  3. Controle a temperatura da água: Use água entre 60°C e 65°C - nunca mais quente que isso! Um aquecedor com regulador de temperatura é um investimento que vale a pena, tanto pelo sabor quanto pela saúde.

  4. Pratique a montagem da cuia: No início, pode parecer complicado, mas com prática se torna natural.

  5. Experimente diferentes tipos de erva: Cada marca e tipo tem seu próprio perfil de sabor.

  6. Seja paciente: O gosto pelo chimarrão geralmente é adquirido com o tempo.


Neste Dia Nacional do Chimarrão, convido você a experimentar esta tradição centenária que conquistou meu coração alemão e se tornou parte do nosso projeto do Kurpark em São Bonifácio. Quem sabe você não se apaixona também? Só cuidado: você pode acabar como eu, com uma coleção de cuias e um amor incontrolável por essa bebida ancestral - mas sempre com a água na temperatura certa!

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